MOSTRA.TERTÚLIA
15, 22, 29 NOVEMBRO | DOMINGOS | 17H
TEATRO-ESTÚDIO ANTÓNIO ASSUNÇÃO
Este ano, prosseguindo a colaboração com o Departamento de Ciências Sociais Aplicadas da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, a Mostra de Teatro de Almada propõe um ciclo de três tertúlias dedicadas a diferentes perspetivas sobre o teatro na sua relação com a pedagogia, a ciência e o arquivo. O objetivo é, justamente, estabelecer um momento de diálogo entre pessoas e práticas que, sendo aparentemente de universos distintos, têm o teatro como objeto comum de investigação. As sessões decorrem no foyer do Teatro António Assunção, nas tardes de domingo da Mostra, às 17h.
Organização: Artes e Engenhos - Associação Cultural e Ninho de Víboras
15 DE NOVEMBRO
TERTÚLIA POR CHRISTOPHER AURETTA
“Em torno das mandíbulas do quotidiano, as dores de dentes e as dores de parto: um manifesto dramático-pedagógico”
Há muito tempo que temos vindo a constatar os efeitos nocivos de uma pedagogia, hoje em dia generalizada, em que se impõe o mero reproduzir do saber (mediante a memorização obrigatória de factos em detrimento da autêntica compreensão, a industrialização da mente dos jovens por via de uma avaliação opressiva indiferente à curiosidade inerente ao ser humano, o desprezo da abundância imaterial-cognitiva que faz parte do metabolismo fundamental da nossa espécie). Esta reprodução privilegia as respostas sobre a atitude questionante; uma atitude passiva relativamente à busca apaixonada necessária para atingir novos estádios de consciencialização; uma incultura pedagógica que educa para a obsolescência, sobretudo, para a obsolescência da imaginação. Antonin Artaud escreve sobre “os direitos da imaginação” e sobre a criatividade que visa despertar no ser humano a consciência da vida como “espasmo”, “laceração” e “conflito perpétuo”, sendo a violência simbólica associada a este léxico teatral a via pela qual o ator (e, às tantas, a humanidade de que o ator é emissário e testemunha) se liberta dos condicionalismos impostos por fora e por dentro. No fim de tal libertação, acede-se ao território do humano situado “entre o sonho e o mundo concretizado”, i.e., uma experiência mais integrada do nosso lugar colectivo e pessoal no mundo e no cosmos. O encenador Peter Brook refere, por sua vez, a ideia de um “holy theatre”: “a means for self-study, self-exploration; a possibility of salvation”.
E se abordássemos a sala de aula como se se tratasse de uma espécie de palco? Se vivêssemos a relação entre docente e alunos como uma espécie de teatro vivo, uma paixão dialogante, um drama de parto em relação ao qual todos os intervenientes (docente e alunos) são os nascituros metafísicos, imaginativos e cognitivos?
Afirmamos que é bem possível. Com Antonin Artaud, Peter Brook, Eugénio Ionesco e breves fragmentos dramáticos da nossa autoria, pretende-se exemplificar uma pedagogia ao rubro, ao vivo e, por certo, nos antípodas da ditadura atual deste século conturbado.
Christopher Damien Auretta doutorou-se pela Universidade da Califórnia, Santa Bárbara, EUA. Lecciona no Departamento de Ciências Sociais Aplicadas da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa onde organiza seminários em Pensamento Contemporâneo e na área de ciência e literatura, focando, sobretudo, exemplos da representação estética da modernidade técnico-científica. Tem publicado e/ou participado em colóquios debruçando-se sobre a obra de António Gedeão, Fernando Pessoa, Jorge de Sena, Machado de Assis, Primo Levi e Roald Hoffmann, bem como sobre questões relacionadas com a bioarte. Tem traduzido e publicado em inglês poesia de Fernando Pessoa e António Gedeão. Publicações recentes incluemDez Anos in Portugal, Ensaios, Prosa, Poesia; Álvaro de Campos, Autobiografia de uma Odisseia Moderna; Diário de Bordo, Aspectos do Pensamento Contemporâneo; Pequeno vade-mécum ad loca infecta: para docentes, estudantes e outros mártires (=testemunhas) da modernidade cansados mas ainda capazes de uma ténue esperança; Em torno do cinema, Visualizando a modernidade: narrativas e olhares do ecrã e Cem dias de soldão, Crónicas pedagógicas na Babel contemporânea, todas publicadas na Colibri.
22 DE NOVEMBRO
TERTÚLIA POR ANA CARNEIRO
"Oxigénio"
A ‘descoberta’ do oxigénio está indelevelmente associada ao nome de Antoine-Laurent Lavoisier (1743-1794), bem como à questão da prioridade na descoberta deste gás que disputou com Joseph Priestley (1733-1804) e Carl Scheele (1742-1786). É este o tema da peça "Oxigénio" da autoria de Carl Djerassi (1923-2015) e Roald Hoffmann (1937-).
Começando pelos autores, Djerassi é principalmente conhecido pelas suas contribuições para o desenvolvimento da pílula anticoncecional, mas também pelos seus romances e peças de teatro, sendo um colecionador de arte, especialmente de obras de Paul Klee. Roald Hoffmann é um químico teórico, galardoado com o Prémio Nobel da Química, em 1981, que compartilhou com Kenichi Fukui; dedicou-se também à escrita, com destaque para a poesia.
A intriga desta peça gira em torno Lavoisier, Priestley e Scheele e das respetivas mulheres. A ação decorre em dois tempos, 1777 e 2001, ano em que o comité Nobel, pretendendo atribuir um ‘retro-Nobel’, discute o conceito de descoberta científica.
Desde as contribuições científicas dos autores e suas implicações na sociedade do século XX, ao conteúdo da peça, não faltam motivos para troca de ideias: o papel e objetivos da ciência e de quem a pratica; a importância do estatuto social e dos meios disponíveis para a prática científica; a prioridade na descoberta e a construção de uma reputação; o papel das mulheres na ciência e na sociedade - até porque é com um diálogo entre três mulheres que a peça se inicia.
Ana Carneiro, professora de história das ciências na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa. Os seus trabalhos têm incidido, principalmente, sobre a história das ciências do século XIX e princípio do século XX, com especial destaque para a história da química e da geologia.
29 DE NOVEMBRO
TERTÚLIA POR ALEXANDRE CALADO
"Criação com traços de arquivo”
Que versão da história das artes cénicas guardo no meu corpo? Pode uma experiência performativa ser preservada? Porquê citar um espetáculo noutro? Morreu realmente o autor? A discussão partirá de espetáculos que trabalham no movimento entre arquivo e cena, para enfrentar estas questões. Procuraremos ver como fotografias e vídeos de espetáculos, assim como declarações de intenções dos artistas e textos de apreciação crítica, podem constituir materiais e estímulos para uma criação implicada criticamente. Daremos alguma atenção particular à história das artes cénicas em Portugal mas tomaremos exemplos da prática contemporânea mundial para consubstanciar os argumentos apresentados.
Alexandre Pieroni Calado. Nasceu em Lisboa, faz e investiga teatro. Atualmente trabalha num ciclo de projetos de investigação, criação e difusão teatral em torno de materiais de arquivo de encenações portuguesas do século vinte, no qual apresentou Woyzeck 1978 (2014), Quarteto (2013), Pregação (2012). Recentemente foi ator em Tartufo (2014), de Molière, encenado por Rogério de Carvalho, e assistente de encenação de Ivica Buljan, em Cais Oeste (2014). Licenciado em Teatro (ESTC/IPL, Lisboa 2007) e o Doutorado em Artes Cênicas (ECA/USP, São Paulo 2011), publicou artigos sobre crítica genética, processos formativos e presença, entre outros temas, em revistas e actas de congressos em Portugal e no Brasil.
15 DE NOVEMBRO
TERTÚLIA POR CHRISTOPHER AURETTA
“Em torno das mandíbulas do quotidiano, as dores de dentes e as dores de parto: um manifesto dramático-pedagógico”
Há muito tempo que temos vindo a constatar os efeitos nocivos de uma pedagogia, hoje em dia generalizada, em que se impõe o mero reproduzir do saber (mediante a memorização obrigatória de factos em detrimento da autêntica compreensão, a industrialização da mente dos jovens por via de uma avaliação opressiva indiferente à curiosidade inerente ao ser humano, o desprezo da abundância imaterial-cognitiva que faz parte do metabolismo fundamental da nossa espécie). Esta reprodução privilegia as respostas sobre a atitude questionante; uma atitude passiva relativamente à busca apaixonada necessária para atingir novos estádios de consciencialização; uma incultura pedagógica que educa para a obsolescência, sobretudo, para a obsolescência da imaginação. Antonin Artaud escreve sobre “os direitos da imaginação” e sobre a criatividade que visa despertar no ser humano a consciência da vida como “espasmo”, “laceração” e “conflito perpétuo”, sendo a violência simbólica associada a este léxico teatral a via pela qual o ator (e, às tantas, a humanidade de que o ator é emissário e testemunha) se liberta dos condicionalismos impostos por fora e por dentro. No fim de tal libertação, acede-se ao território do humano situado “entre o sonho e o mundo concretizado”, i.e., uma experiência mais integrada do nosso lugar colectivo e pessoal no mundo e no cosmos. O encenador Peter Brook refere, por sua vez, a ideia de um “holy theatre”: “a means for self-study, self-exploration; a possibility of salvation”.
E se abordássemos a sala de aula como se se tratasse de uma espécie de palco? Se vivêssemos a relação entre docente e alunos como uma espécie de teatro vivo, uma paixão dialogante, um drama de parto em relação ao qual todos os intervenientes (docente e alunos) são os nascituros metafísicos, imaginativos e cognitivos?
Afirmamos que é bem possível. Com Antonin Artaud, Peter Brook, Eugénio Ionesco e breves fragmentos dramáticos da nossa autoria, pretende-se exemplificar uma pedagogia ao rubro, ao vivo e, por certo, nos antípodas da ditadura atual deste século conturbado.
Christopher Damien Auretta doutorou-se pela Universidade da Califórnia, Santa Bárbara, EUA. Lecciona no Departamento de Ciências Sociais Aplicadas da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa onde organiza seminários em Pensamento Contemporâneo e na área de ciência e literatura, focando, sobretudo, exemplos da representação estética da modernidade técnico-científica. Tem publicado e/ou participado em colóquios debruçando-se sobre a obra de António Gedeão, Fernando Pessoa, Jorge de Sena, Machado de Assis, Primo Levi e Roald Hoffmann, bem como sobre questões relacionadas com a bioarte. Tem traduzido e publicado em inglês poesia de Fernando Pessoa e António Gedeão. Publicações recentes incluemDez Anos in Portugal, Ensaios, Prosa, Poesia; Álvaro de Campos, Autobiografia de uma Odisseia Moderna; Diário de Bordo, Aspectos do Pensamento Contemporâneo; Pequeno vade-mécum ad loca infecta: para docentes, estudantes e outros mártires (=testemunhas) da modernidade cansados mas ainda capazes de uma ténue esperança; Em torno do cinema, Visualizando a modernidade: narrativas e olhares do ecrã e Cem dias de soldão, Crónicas pedagógicas na Babel contemporânea, todas publicadas na Colibri.
22 DE NOVEMBRO
TERTÚLIA POR ANA CARNEIRO
"Oxigénio"
A ‘descoberta’ do oxigénio está indelevelmente associada ao nome de Antoine-Laurent Lavoisier (1743-1794), bem como à questão da prioridade na descoberta deste gás que disputou com Joseph Priestley (1733-1804) e Carl Scheele (1742-1786). É este o tema da peça "Oxigénio" da autoria de Carl Djerassi (1923-2015) e Roald Hoffmann (1937-).
Começando pelos autores, Djerassi é principalmente conhecido pelas suas contribuições para o desenvolvimento da pílula anticoncecional, mas também pelos seus romances e peças de teatro, sendo um colecionador de arte, especialmente de obras de Paul Klee. Roald Hoffmann é um químico teórico, galardoado com o Prémio Nobel da Química, em 1981, que compartilhou com Kenichi Fukui; dedicou-se também à escrita, com destaque para a poesia.
A intriga desta peça gira em torno Lavoisier, Priestley e Scheele e das respetivas mulheres. A ação decorre em dois tempos, 1777 e 2001, ano em que o comité Nobel, pretendendo atribuir um ‘retro-Nobel’, discute o conceito de descoberta científica.
Desde as contribuições científicas dos autores e suas implicações na sociedade do século XX, ao conteúdo da peça, não faltam motivos para troca de ideias: o papel e objetivos da ciência e de quem a pratica; a importância do estatuto social e dos meios disponíveis para a prática científica; a prioridade na descoberta e a construção de uma reputação; o papel das mulheres na ciência e na sociedade - até porque é com um diálogo entre três mulheres que a peça se inicia.
Ana Carneiro, professora de história das ciências na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa. Os seus trabalhos têm incidido, principalmente, sobre a história das ciências do século XIX e princípio do século XX, com especial destaque para a história da química e da geologia.
29 DE NOVEMBRO
TERTÚLIA POR ALEXANDRE CALADO
"Criação com traços de arquivo”
Que versão da história das artes cénicas guardo no meu corpo? Pode uma experiência performativa ser preservada? Porquê citar um espetáculo noutro? Morreu realmente o autor? A discussão partirá de espetáculos que trabalham no movimento entre arquivo e cena, para enfrentar estas questões. Procuraremos ver como fotografias e vídeos de espetáculos, assim como declarações de intenções dos artistas e textos de apreciação crítica, podem constituir materiais e estímulos para uma criação implicada criticamente. Daremos alguma atenção particular à história das artes cénicas em Portugal mas tomaremos exemplos da prática contemporânea mundial para consubstanciar os argumentos apresentados.
Alexandre Pieroni Calado. Nasceu em Lisboa, faz e investiga teatro. Atualmente trabalha num ciclo de projetos de investigação, criação e difusão teatral em torno de materiais de arquivo de encenações portuguesas do século vinte, no qual apresentou Woyzeck 1978 (2014), Quarteto (2013), Pregação (2012). Recentemente foi ator em Tartufo (2014), de Molière, encenado por Rogério de Carvalho, e assistente de encenação de Ivica Buljan, em Cais Oeste (2014). Licenciado em Teatro (ESTC/IPL, Lisboa 2007) e o Doutorado em Artes Cênicas (ECA/USP, São Paulo 2011), publicou artigos sobre crítica genética, processos formativos e presença, entre outros temas, em revistas e actas de congressos em Portugal e no Brasil.